terça-feira, 22 de setembro de 2009


Eu não chorei !

Não sei se com o tempo, ou o apredizado (às vezes amargo)nós vamos nos calando diante das decepções,traições,enganos,que não conseguimos chorar,lamentar.Talvez fique o gosto amargo de não ter aprendido uma licão,ou em algum lugar dentro de nós ainda um resquício de otimismo,de esperança e fé no ser humano,principalmente quando esse ser nos é tão especial.Falo de amores,de amizades,e de uma geração que cresceu ouvindo que esse era o País do futuro.E o Futuro chegou...e todos a quem escolhemos,e não esqueçam,nós escolhemos:Os amores que fracassam, os amigos que decepcionam,os que dirigem esse País,não merecem nada de nós muito menos uma ùnica lágrima.Confiamos e fomos traídos,enganados,magoados.

É aceitar que fizemos escolhas erradas,por mais que nos machuque,e aprender.

Só há duas maneiras, pelo amor, ou pela dor.A escolha é nossa.Não perdemos só uma copa do mundo!Vimos nosso amor, esperança, ser desdenhados por brasileiros que vivem muito bem na Europa, ganham em euros,moram em mansões,salários milionários.Vivem como reis.

Nós somos apenas os súditos,que esperamos o pão e o circo a cada quatro anos.

Ou copa ou eleição.

Esse é o País do presente,de um povo pacífico,alegre,que canta e dança apesar de tudo.

Talvez seja por isso que nos acostumamos cedo a perder,a ser lesados por tudo e por todos.

Aonde está o povo heróico da Pátria amada?

Vamos saber logo, já que teremos mais uma copa do mundo e Eleições!!

sábado, 20 de junho de 2009


Um Apólogo
Machado de Assis

Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:
— Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma cousa neste mundo?
— Deixe-me, senhora.
— Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar insuportável? Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabeça.
— Que cabeça, senhora? A senhora não é alfinete, é agulha. Agulha não tem cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros.
— Mas você é orgulhosa.
— Decerto que sou.
— Mas por quê?
— É boa! Porque coso. Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu?
— Você? Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu e muito eu?
— Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados...
— Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás obedecendo ao que eu faço e mando...
— Também os batedores vão adiante do imperador.
— Você é imperador?
— Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto...
Estavam nisto, quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela. Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser. Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da costureira, ágeis como os galgos de Diana — para dar a isto uma cor poética. E dizia a agulha:
— Então, senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco? Não repara que esta distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a eles, furando abaixo e acima...
A linha não respondia; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa, como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas. A agulha, vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia mais que o plic-plic-plic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou a costura, para o dia seguinte. Continuou ainda nessa e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile.
Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava de um lado ou outro, arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha para mofar da agulha, perguntou-lhe:
— Ora, agora, diga-me, quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas? Vamos, diga lá.
Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha:
— Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico.
Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça:

— Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária!